Clima de chuvas e trovoadas (*)
Desmarquem seus compromissos, adiem as possibilidades de romances, cancelem os namoros recentes, os mais duradouros conhecem e não se assustam com as pantufas. No máximo, um beijo roubado. E providencie a entrega pela locadora de um pacote de DVDs para, literalmente, passar o mau tempo. Pipoca, vinho e uma comida quentinha também são aconselháveis. Serão, no mínimo, dois dias de chuvas e trovoadas. Se alguém levasse a sério as previsões metereológicas, certamente, teria seguido à risca as orientações acima. Eu, nem que me avisassem que alguém havia me visto na esquina, arrastava o pé de casa para me procurar.
O final de semana de 8 e 9 de agosto foi de chuvas intensas. E a semana começou sob o domínio dos ventos gelados soprando do quadrante sul. Antes de continuar, confessarei um crime ou sadismo feio para uma pessoa do bem. Sempre que pegava o plantão no Correio do Povo no domingo à tarde, sabia que a chefe Jurema Josefa me mandaria ver a previsão do tempo. Nos primeiros plantões, enchia o texto de esparsos, de quadrantes e velocidade do vento. Com o espaço do Correio reduzido para tanta sabedoria, adotei a vingança de sair na rua olhando com superioridade por antever o que seria do Planeta em segundos, ora.
E ao percorrer o centro atrás de um remédio milagroso para a minha gripe, na segunda-feira, amaldiçoei o segundo em que decidi colocar o pé na rua. Desviando das sombrinhas histéricas e dos sobretudos encharcados (porque deveria existir um manual de etiqueta para dias chuvosos), encontrei os índios que habitam a Rua dos Andradas. De esquina em esquina, os pequenos índios se aglomeravam e cantavam algo que eles chamam de música. E, num ato contínuo lembrei-me do Nei Lisboa do Bom fim cantando “Vinde as mim as criancinhas do Nordeste, que eu ensino a fome a receber cachê”.
Voltei para o meu apartamento, com a porta para arrumar, a cortina para colocar, o interfone para ver porque não fala, os credores me cobrando, e um novo sorteio de contas a pagar, e me senti completamente feliz, estupidamente feliz, loucamente feliz. Porque a chuva continuava a bater na minha janela, eu mesmo combalida pela gripe ainda tinha forças para cuidar de problemas domésticos e a minha filha estava inteirinha lá para me abraçar. E dormi agradecendo a Deus ou sei lá que nome tem pelo que ainda não me tiraram da vida.
Marcadores: Colunas
0 Comentários:
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial