Blog da Marcinha

Ao postar emoções, medos, sensações e utopias aqui, através de fotos, pensamentos, crônicas, artigos e poesias, entrego a vocês um pedaço enorme do meu coração, por vezes ferido, outras alerta ou contente. Use com moderação!

07 setembro, 2009

Lohana nos meus braços (*)

Hoje, não vou escrever sobre dissabores e pequenas mágoas. Não! Disciplinarei meus dedos para que as teclas não se sintam donas de si e falem do diploma de jornalista, roubado pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Nem dos seguidos atos de truculência cometidos pela Brigada Militar no novo jeito de governar. Nem da covardia daqueles que escondem o nome do assassino do sem-terra, morto na desocupação da Fazenda Southall, no dia 21 de agosto, em São Gabriel. Nada de salário menor do que o mês, de preocupações com a minha filha adolescente, do meu time que não ganha fora de casa.
Para não dizer que não falo de flores, divido com você, meu leitor nauta, neste espaço, o perfume de rosas, cravos, jasmins e outros, que já invadem o meu apartamento para receber a primavera. E sinto, antecipadamente, os cheiros das flores, ainda imaginárias, mas que já exalam gotas de ternura e respingam harmonia na minha vida. Neste cenário de quase primavera, mas sob um verão de 30 e tantos graus no domingo à tarde, reunindo a família para comemorar os 24 anos do meu sobrinho e afilhado Rafael, trabalhador, estudante, que se vira por conta própria, cheio de projetos, que recebi um novo estímulo de vida.
Após o almoço, no pit stop que fizemos na casa da minha mãe para um cafezinho, praticamente todos já haviam segurado a pequena Lohana, brindando também os seus quatro meses naquele dia. Pois, a Lohana, filha da Camila, irmã do Rafael, que seria minha sobrinha-neta, não fosse eu adotá-la como neta, ainda não experimentara meu colo naquele dia. Chegara, portanto, a vez da vó Márcia. E com a Lohana acomodando seu pequeno rosto bochechudo no meu ombro, com os olhinhos acompanhando qualquer quadro, enfeite e móbile ao seu alcance, iniciei o trajeto de um lado a outro do corredor, o ir e vir entre os quartos.
Com a mesma desafinação que fazia desmaiar de sono e enjoo os meus irmãos menores, o Rafael e a Camila, e a filha Gabriela, entoei a velha canção de ninar. Passados quase 15 anos do nascimento da Gabriela, tive a impressão de que nunca deixei de cantarolar “se essa rua fosse minha, eu mandava ladrilhar com pedrinhas de brilhante, só prá ver meu bem passar”. De trás para frente, forçando o refrão, pulando estrofes, embalei Lohana nos meus braços. Abaixando o tom de voz, naquele estágio que só as mães alcançam e indica a rendição do rebento. E dentro do bosque que se chama solidão, as palavras calando, sumindo....
Assim, ao chegar o entardecer, acalantando a filha de minha sobrinha, deixei o pranto correr, e sussurando pedi que o mundo fique melhor, que todos possam ter educação, habitação e saúde, que ela conheça um Planeta mais verde, um País mais justo e um universo mais solidário. Exatamente como eu fazia com a mãe de Lohana, a Camila no colo, a minha pequenininha que hoje é uma mãe de família. Um filme com rodízio de personagens. Não sei se contaminada pelo cheiro inesquecível de inocência que Lohana emana ou se pelo aroma imaginário da primavera, passei o resto da semana em estado de graça.

Nada se compara ao milagre da vida. Nada é tão revigorante como rever o passado assim tão nítido. Nada como um pedaço de ser no nosso colo para nos fazer esquecer da inflação, da violência, do emprego, da conta e de todo o mundo lá fora.
(*) márcia fernanda peçanha martins

Marcadores:

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial