A gérbera da Gabriela (*) (**)
Se o poeta português Fernando Pessoa já sentenciava que “pensar uma flor é vê-la e cheirá-la”, conviver com uma todos os dias, há mais de 13 anos, é habitar um jardim florido, fecundo e sempre com novas plantas para desabrochar. A cada visita inesperada ao jardim, em qualquer uma das quatro estações, podemos encontrar uma espécie que se abre em pétalas para nos receber e nos entorpecer com seu perfume. A vida com a minha filha Gabriela Martins Trezzi tem sido assim, dia ímpar e dia par, desde 6 de dezembro de 1994, quando essa sagitariana foi expulsa do meu ventre e vem plantando sementinhas de amor no meu coração.
Não me coloquem, por favor, o rótulo de super-mãe (se vocês soubessem, como eu sou cheia de defeitos, alguns de fábrica), mas o meu convívio com a Gabriela é uma relação que floresce o ano inteiro. Só que seu auge ocorre na primavera e no verão. Assim como algumas flores. As gérberas, por exemplo, muito apreciadas pelo decoradores e amantes das belezas florais, e que eu amo de paixão, apresentam esse comportamento. Elas florescem todo o ano, mas são nas duas últimas estações que se mostram, do branco ao vermelho intenso, em mais de 20 tonalidades diferentes, passando por tons amarelos e alaranjados.
Na primavera e no verão, principalmente, a Gabriela parece que fica “eternamente ligada na tomada” e é preciso muito pique para acompanhá-la. Mas não estou me queixando (quem pariu Mateus, que o embale, pois, pois...). Como nesta quarta-feira, enquanto procurava assunto para a coluna e havia decidido que não falaria de morte, lágrimas, tristezas, melancolias ou amores partidos, e Gabriela chegou do colégio totalmente eufórica. Atirou-se na minha cama enquanto aguardava os minutos que nos separavam da hora do almoço e com um cansaço visível no rosto, reclamou do desgaste em função das Olimpíadas do colégio.
A pequena notável, que já ostenta medalha de ouro no basquete (ai, que mamãe coruja), prata em handebol e voleibol, e ainda disputa e espera ganhar mais ouro no futsal, está envolvida, desde a segunda-feira, nas Olimpíadas do colégio. Logo, a declaração de cansaço poderia sinalizar bandeira branca, isto é, alguns instantes de sossego. Mas, como disse, ela é um jardim florido. Uma gérbera que cresce a pleno sol, mas também pode crescer embaixo da sombra. Capaz de transformar um dia comum em uma data especial e um ambiente simples e sombrio em um local sofisticado e aconchegante.
Mal terminara de voltar para retomar a redação da coluna, após o almoço, e Gabriela aparece na porta do quarto (meu QG) e, com ares indescritíveis de sapeca, como quando tinha uns seis anos, pergunta: “mãe, tem um tempinho só para ouvir uma musiquinha?”. Sem pestanejar, interrompo qualquer tarefa que ficará minutos inacabada para cumprir meu papel de mãe e atender ao pedido da filha, imaginando que vou escutar aqueles funks horríveis que ela curte. Daí, ela canta: “eu sou um bolinho de arroz, minhas perninhas vieram só depois, meus braçinhos ainda estão por vir, mas eu tenho um sorriso para sorrir”.
Com um beijo estalado e me deixando atônita diante daquela travessura musical- que não condiz com algumas atitudes de pré-adolescente que deseja ir no baile teen, usar salto alto e outros detalhes particulares – ela saiu feito um furacão para o colégio onde recomeçariam as Olimpíadas no turno da tarde. Gabriela, nesse momento, ficou totalmente semelhante a uma gérbera, que significa a inocência da criança, mas também representa a sensibilidade, a sensualidade, o charme e a essência, o amor e a nobreza, a virtude, a dedicação, a quietude, a alegria, a simplicidade e a pureza.
A gérbera parece uma margarida colorida. E não sei se pela brincadeira do bem-me-quer, mal-me-quer (uma eterna romântica...hehehe) sempre gostei muito da margarida. Daí, a paixão pela gérbera, prima fashion da margarida, foi fácil e inevitável. E descobrir na minha cria, que foi crescendo e ganhando espaço, em todos os cantos da minha vida passada, presente e futura, que ela semeia um jardim repleto de gérberas é como viver dentro de uma permanente primavera. E quem disse que não posso falar de flores ?
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