O voto da periferia (*)
Cada nova manhã estampa uma notícia difícil de engolir
Cada final de almoço tem um gole de café amargo de tragar
Cada entardecer aparece um companheiro pra acudir
A vida segue, com seus passos peregrinos
Ela é soberana, se enfeita, se perfume e nem dá bola
A esperança respira, com sua força de criança
Ela é insegura, se espreita, se esconde e se enrola
Um partido se constrói e se destrói, muito rápido
Não há mais comício, reunião e nem agito de bandeiras
Um partido se gesta e se enterra, sem convite
Não há mais estrela, nem vasos esperando nas soleiras
Mesmo assim, Dona Leonor enfeitou-se de domingo,
Vestido e chapéu de aba larga que ganhou de presente,
Pro sol não esquentar a cabeça e não esquecer o caminho,
Que leva até a seção em que ela vai votar no presidente
Pegou o ônibus cedinho lá da periferia e levou seu João,
Ainda com cheiro horrível de pinga da noite não dormida,
Em todo o caminho, de solavancos e poeira, a comadre
Não desfez um papel amassadinho fechadinho em sua mão
Desceu da condução, confusa e tonta com as buzinas,
Mas é dia de passeio, de conversa fora, de euforia
Não perdeu a pose, botou batom, se ajeitou e se arrumou,
Leonor, de braço com João, foi brincar de cidadania.
márcia fernanda peçanha martins
(*) em homenagem aos 327.799 eleitores de Porto Alegre (41% dos votos válidos) que tentaram, no dia 26 de outubro de 2008, devolver a cidade aos seus moradores, através da candidata da Frente Popular, Maria do Rosário
Marcadores: Poemas
1 Comentários:
Só podia partir de ti, Márcia, um poema sensível como este. E ainda mais homenageando os nossos eleitores. Parabéns por todo o blog e,especialmente, por esta postagem.
Beijos
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