Blog da Marcinha

Ao postar emoções, medos, sensações e utopias aqui, através de fotos, pensamentos, crônicas, artigos e poesias, entrego a vocês um pedaço enorme do meu coração, por vezes ferido, outras alerta ou contente. Use com moderação!

24 janeiro, 2009

Viver ultrapassa o entendimento (*)


Pela primeira vez, desde que escrevo para o Coletiva, experimentei um desânimo, falta de assunto e vontade de mandar tudo práquelelugar (sei que não é junto, mas digamos, criei uma figura de linguagem). Se você é meu leitor de carteirinha, não se preocupe não se trata de TPM e nem crise de identidade. Tudo passa. E, se você odeia minha coluna (ai, te pego um dia de jeito) e fica mandando comentários negativos, não se anime muito. Pode ser a saudade da rotina da redação, dos amigos que não procuram, do sol que sumiu, do chope com batatas fritas com o namorido. Coisas de Porto Alegre Triste no verão.
E vamos combinar! Não há nada tão triste com a saudade. Clarice Lispector, que assim como Caio Fernando Abreu, tem passagens ótimas para os dias em que se está blasé, já disse. “Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas, às vezes, a saudade é tão profunda que a presença é pouca: quer-se absorver a pessoa toda”. E prossegue; “essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida”. Sei que a definição é literal, mas não tenho como absorver tantas situações de saudade que me oprimem.
Na trilha de Clarice, vou tentar diminuir esta dor que hoje sinto e que é só minha e lembrar que “viver ultrapassa todo o entendimento”. Então, se não é possível entender tanta vida levada ao extremo, vou fingir que não tou nem aí se já não posso correr para os braços de minha mãe e pedir consolo porque ela está adoentada e não pode se incomodar mais. Ultrapassa o entendimento. E que mais pai redescobri tardiamente e mora distante para eu pedir-lhe um carinho presencial. E que os amigos especiais (aqueles 7/8) são amigos, mas não podem viver nossa vida por nós. Ultrapassa o entendimento.
Novamente, me apropriando de um pensamento de Clarice (aff, será ela não deve ser co-autora da coluna?), recordo de um que se encaixa muito bem no meu dia de paisagem. “Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa, ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar”. Mas, hoje, sinto-me leve como uma brisa, incapaz de convidar você para olhar o pôr-do-sol do Guaíba, um café na Casa de Cultura Mário Quintana, uma volta no Mercado Público ou um passeio na Redenção. É que estou leve, mas com sentimentos capazes de produzir furacões e vulcões. Não se aproxime!
Palavra de mulher. Semana que vem nem me lembrarei deste texto derramando fel, do meu descontentamento com as saudades que serão sempre só saudades e nada mais, do sumiço de amigos, da música “Atrás da Porta” que se repete no play do CD, talvez não lembre nem de mim este estado de desligada da tomada. Uma das muitas coisas que aprendi com Clarice (tou extremamente íntima, viram?) é que se deve viver apesar de. “Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive, muitas vezes, é o próprio apesar de que nos empurra para frente”. Que assim seja!

(*) márcia fernanda peçanha martins

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