Blog da Marcinha

Ao postar emoções, medos, sensações e utopias aqui, através de fotos, pensamentos, crônicas, artigos e poesias, entrego a vocês um pedaço enorme do meu coração, por vezes ferido, outras alerta ou contente. Use com moderação!

29 maio, 2008

Você sempre volta


Carrego na bolsa teus pertences.
E no roupeiro, deixei algumas roupas.
Relembro voltas e idas de suspense.
E eu me desmanchando feito trouxa.

Na geladeira, uma boa marca de vinho
E um prato congelado para emergência.
Recordo das vezes que buscaste abrigo
E eu me entregando sem consciência.

Escaldada, no armário do banheiro,
Tem loção de barba e escova de dente.
Se você resolver chegar sorrateiro,
E eu me esqueço e abro precedente.

Você fala alto, xinga e bate a porta.
E fica um jeito de que nada terminou.
E eu vou desfalecendo, quase morta.
À espera do amor que ainda não acabou.

Porque tem que ser assim tão selvagem?
Porque fico longas noites com insônia?
Se eu não tenho vergonha e nem coragem
e me ofereço, vencida, fedida de colônia?


márcia fernanda peçanha martins

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17 maio, 2008

Sentimentalóide no inferno astral

Não vou falar de inferno astral, no qual estou ardendo desde 9 de maio, porque alguém de má índole (e esta espécie prolifera!) poderia pensar que estou lembrando o dia do meu aniversário para ganhar presentes. Uma calúnia em se tratando de geminiana da “gema” por todos os poros, ascendentes, descendentes, antepassados, sol, lua e planeta. Nem vou lamentar a falta de grana, de free, de espaço verde e de concreto, porque quando a gente quer ser contra consegue mesmo. Não quero me queixar da ausência do abraço, do carinho, do abrigo, do amigo, e até mesmo da vontade de sentir cansaço.
Totalmente fora da casinha quem pensou que eu iria blasfemar contra a disparada nos preços dos hortigranjeiros (viu, Jorge aprendi). Mas, não dá para passar batido que é praticamente um horror o preço da alface, uma simples verdura com quantidades razoáveis de vitamina A, C e minerais como cálcio, fósforo e ferro, que disparou de preço. E também disparou das prateleiras da minha geladeira. E se enganou redondamente quem supôs que eu seria saudosista e admitiria que sinto muita falta do rancho mensal que o mesmo Jorge citado acima pesquisava e publicava nas páginas da Economia da Zero Hora.
Mas, devo confessar que tenho acumulado algumas saudades nos últimos dias e não sei se pode creditar toda a culpa ao tal inferno astral. Quem sabe aquilo que nos outros chamamos de velhice e em nós classificamos como amadurecimento de vida? Compreenderam a sutileza? De repente, acordei com saudades de músicas com conteúdo (início, meio e fim) e sem semelhança com qualquer fruta. E põe som na caixa aí que quero escutar Chico Buarque, Elis, Cazuza, exagerado que eu amei Tom Jobim, Rita Lee, João Gilberto, Luis Melodia, Ana Carolina, Nelsinho Coelho e Nei Lisboa.
Um desejo incontrolável de sentar no mesmo banco da mesma praça e comprar um picolé daquele mesmo sorveteiro que assistiu ao primeiro beijo que eu dei num namorado. Uma tentação de comprar balas gasosas ou azedinhas e levar para devorar na matinê do cinema Vitória, no abraço da Borges com Salgado Filho e Andrade Neves, onde eu deveria servir de “chá de pêra” para a minha irmã mais velha e seu namorado. E, ai quem me dera, pudesse descascar laranjas após o almoço e sentar debaixo da árvore do quintal da minha casa na infância, saboreando gomos sem agrotóxicos e brincando com os quatro cachorros.
Sabe-se lá que bicho me mordeu! Talvez saudades do meu irmão Dédi, que faleceu no dia 12, deste mês, há cinco anos. E que era meu porto seguro, meu ombro amigo, meu lado esquerdo e direito, meu irmão, camarada, compadre, grande publicitário, piadista, meu maior fornecedor de emails matinais desejando bom dia. Queria tanto que ele soubesse como a afilhada dele, a minha filha Gabriela Martins Trezzi, está linda, maravilhosa, amada, carinhosa, com boa saúde, ótimas notas no colégio e companheirona. Mas, certamente, ele acompanha e guia os nossos passos.
Dédi, se você cruzar por aí, não sei em que plano, com uma menina de seis anos, chamada Isabella, morta ao ser atirada do sexto andar do apartamento onde residiam seu pai e a madastra, diga-lhe que a mãe dela, Ana Carolina de Oliveira, chorou muito no Dia das Mães e espalhou emoção nacional ao conceder entrevista falando sobre os seus sentimentos. Será que foi naquele dia o início explosivo de tanta saudade? Uma mistura. Gabriela linda e saudável passando o domingo comigo. A mãe de Isabella, que também era bonita e faceira, chorando descontroladamente a ausência definitiva da filha.
Danem-se aqueles que não gostam de sentimentalóides! Eu não sei fugir das minhas emoções, que estão sempre à flor da pele. Nem mesmo fingir que não me importo que não vejo as injustiças, que a maldade das pessoas não me dói e que a morte gradativa da ternura, toda vez que uma criança tem sua sorte apunhalada não me derruba. E isso não entra na conta do inferno astral.
márcia fernanda peçanha martins (publicado no site www.coletiva.net em 14/05/2008)

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Marcas do que se foi

Aqui, vou colocar "provas" de que de vez em quando eu escrevo e, pior, tem gente até que gosta










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10 maio, 2008

Dia das Mães

MAMÃE.COM
Queridos Filhos,
Em primeiro lugar, Mamãe gostaria de agradecer a presença de todos nesta Primeira Convenção Familiar. Mamãe sabe como foi difícil abrir um espaço nas agendas de cada um de vocês: Papai tinha uma lavagem de carro praticamente inadiável, Júnior já tinha marcado de se trancar no quarto, Carol estava para receber pelo menos três telefonemas importantíssimos de uma hora e meia cada um. Mamãe está comovida. Muito obrigada.
Bem, conforme Mamãe já tinha mais ou menos antecipado, esta convenção é para comunicar ao público interno - Papai, Júnior e Carol - todas as modificações nos produtos e serviços da linha Mamãe. Como vocês sabem, a última vez que Mamãe passou por reformulações foi há 14 anos, com o nascimento do Júnior. De lá para cá, os hábitos e costumes, o panorama cultural, a economia e o mercado passaram por transformações radicais. Mamãe precisa acompanhar a evolução dos tempos, sob pena de ver sua marca desvalorizada. Para começar, Mamãe vai mudar a embalagem. Mamãe sabe que esta é uma decisão polêmica, mas, acreditem, é o que deve ser feito. Mamãe sai desta convenção direto para um spa, e de lá para uma clínica de cirurgia plástica. Nada assim tão radical. Haverá pouquíssimas alterações de rótulo, vocês vão ver. Mamãe vai continuar com praticamente o mesmo formato, só que com linhas mais retas em alguns lugares e linhas mais curvas em outros. Calma, Papai! Mamãe já captou recursos no mercado. Mamãe vai ser patrocinada por uma nova marca de comida congelada. Lei Rouanet, porque Mamãe também é cultura.
Junto com o lançamento da nova embalagem de Mamãe, no entanto, acontecerá o movimento mais arriscado deste plano de reposicionamento. Sinto informar, mas Mamãe vai tirar do mercado o produto Supermãe. Não, não, não adianta reclamar. Supermãe já deu o que tinha de dar. Trata-se de um produto anacrônico e superado, antieconômico e difícil de fabricar. Mamãe sabe que o fim da Supermãe vai aumentar a demanda pela linha Vovó, que disputa o mesmo segmento. Paciência. Você não pode atender todos os públicos o tempo todo. No lugar da Supermãe, Mamãe vai lançar (queriam que eu dissesse 'vai estar lançando', mas me recuso) novas linhas de produtos mais adequados à realidade de mercado. Vocês vão poder consumir Mamãe nas versões Active (executiva e profissional), Light (com baixos teores de pegação de pé), Classic (rígida e orientadora), Italian (superprotetora) e Do-It-Yourself (virem-se, fui passear no shopping). Mas uma de cada vez, sem misturar. Ah, sim, Mamãe detesta esses nomes em inglês, mas me disseram que, se não for assim, não vende.
Mamãe gostaria de aproveitar a oportunidade para lançar seus novos canais de comunicação. De hoje em diante, em vez de sair gritando pela casa, vocês vão poder ligar para o SAC-Mamãe, um 0300 que dá direto no meu celular (apenas 27 centavos por minuto, mais impostos). Mamãe também aceita sugestões e críticas no endereço
mamae@mamae.net
Mais uma vez, Mamãe agradece a presença e a atenção de todos.


(Autoria Desconhecida) - Até porque eu me emocionaria muito ao falar do ato de ser mãe

Mãe dos filhos do mundo

Mãe, minha e de mais quatro filhos,
teu nome ainda ecoa pela casa,
tua presença a emanar brilhos
e os olhos a varar a madrugada.

Os chinelos arrastam no assoalho,
é a mãe que vai medir a febre do menor.
E já sufoca o filho de tanto agasalho,
antes de saber se não é um caso pior.

Toda a noite, antes de no sono pegar,
sem fazer barulho, confere o ronco dos rebentos.
Cobre a mais velha que não gosta de se tapar
e reza sobre cada leito pedindo paz e alento.

Deita no travesseiro e não sossega a cabeça,
pensa na comida, no super, tanto compromisso.
Vencida pelo sono, a mãe é a mais pura beleza,
quando deixa de pensar naquilo, no outro e nisso.

O tempo de descanso é passageiro.
Poucas horas.
O relógio desperta histérico e a rotina se inicia.
Café corrido, lanche na mochila, abraços sem demora.
A mãe sabe que o dia é mais um que principia.

márcia fernanda peçanha martins

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06 maio, 2008

Criança tem cada uma

Nós, os adultos que empilhamos “tijolo por tijolo num desenho lógico, com os olhos embotados de cimento e tráfego”, na tentativa de ajudar a construir um mundo melhor para as crianças de hoje e do futuro, deveríamos, de vez em quando, ouvir a voz sumida da criança que se escondeu no nosso passado. Talvez, a gente conseguisse amenizar as agruras do mundo atual, ser mais complacentes com o próximo ou até evitar a crônica de uma morte anunciada. Simples. Porque criança tem cada uma que nos deixa atônitos. Experimente deixar uma criança sem uma resposta embasada e argumentada. Ninguém consegue.
Tente dizer, por exemplo, para uma criança de sete anos que ela não pode subir naquele armário para pegar um brinquedo lá no alto só porque não pode. Tá maluco? Uma resposta totalmente insatisfatória e que não vai sossegar o pequeno ser. “Ah, mãe, mas eu quero, mas eu quero, vou subir”, suplica reiteradas vezes a fala mansa, mas persistente da criança. E antes que o apressado rotule o menino ou menina insistente de mimado ou mimada, adianto que não se trata de um pequeno rebelde sem ter com que se revoltar. Basta contar que é perigoso, que pode cair, que é arriscado e pode machucar. E pronto.
Com certeza, a criança ficará satisfeita e deixará de insistir, pelo menos nesta travessura. Ai, não me olhe assim como se eu tivesse descoberto a fórmula mágica do amor e ainda por cima repassando para o povo que lê o site (ou meus cinco ou seis leitor nautas???). Por favor. Não sou mestre em auto-ajuda (odeio isso!), não tenho pós em pedagogia e nem PhD em negociações sentimentais. Sou péssima nisso. Faço chantagem, choro, me escabelo. Um desastre!
Nos meus 13 anos e alguns meses de convivência diária com a Gabriela Martins Trezzi, minha filha, sem contar o tempo do relacionamento intra-uterino que foi muito intenso, aprendi tantas coisas que hoje me fazem refletir melhor e até repensar “pequenas maldades”. Ela me ensinou, por exemplo, a olhar para a vida com certa dose de paciência que nunca tive. Ela me contou, também, que tudo pode ser mais colorido se a gente colocar mais matizes no nosso pensamento. Ela me conduziu, sem saber o que fazia para caminhos menos espinhosos, sem cortar as rosas que se espalhavam no nosso trajeto.
E, claro, que eu jamais lhe responda algo com uma negativa. “Porque não, não é resposta mãe. Tem que explicar o motivo”, ela ensinou-me. Em várias etapas de sua vida, ela bateu pé e exigiu argumentos. Até que aprendi (creio). E utilizo a mesma estratégia quando exijo as suas respostas para as primeiras inquietações de adolescente. Mas, entendo que o principal ensinamento, renovado a cada dia, é o do amor incondicional, da confiança, do respeito, do carinho, da cumplicidade.
Por essas e outras é que sugiro, sempre que possível, que o adulto permita uma visita inesperada da criança que lhe habita o passado. Não é um ato fácil, mas confortante e corajoso. E não dói nada. Podem confiar. Dói menos do que perder uma criança no parque. Dói menos do que esquecer o filho dentro do seu próprio carro estacionado em algum shopping. Dói infinitamente menos do que não ter mais aquele olhar de interrogação lhe questionando tudo. Dói menos do que a perda de um filho. Dói menos do que saber que seu filho (a) foi asfixiado, sufocado e maltratado até a morte, tombado num jardim de um condomínio.


márcia fernanda peçanha martins (publicado originalmente no http://www.coletiva.net/)

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Chora mãe

Chora a alma da mãe despedaçada.
Junta os cacos da filha que partiu.
Recolhe os brinquedos na sacada.
E distribui a roupa que nem serviu.

Derrama dor a mãe agora abandonada.
Tira o porta-retrato da estante.
Esvazia o roupeiro. Não deixa nada.
Que a filha morta é um ser errante.

A lágrima da mãe escorre,
a mão da mãe está suada,
os olhos tremem desesperadamente.
Tudo pela menina morta de repente

márcia fernanda peçanha martins

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